quinta-feira, 19 de junho de 2008

INTERNET E CIDADANIA

É certo que S. Majestade o Senhorio José Maria Neves tentou desqualificar esse belo gesto de cidadania, impregnado, aliás, da mais nobre e comovente vontade de ajudar o próximo. Para esse pequeno tirano neo-stalinista, a citada Petição não passou de uma "tempestade num copo de água". Ou seja: a Constituição da República e os valores fundamentais que ela defende não merecem qualquer atenção especial do Governo. São supérfluos, rótulos sem importância, perante a suprema "razão de Estado" do PAICV e os "superiores interesses" da clique instalada
"O poder tem medo da Internet" – Manuel Castells
Ninguém consegue, nos dias que correm, entender o fenómeno do "poder" se não prestar uma atenção redobrada às novas tecnologias de informação, sobretudo à Internet.
Como bem frisou Manuel Castells, já não pertencemos à "galáxia de Gutenberg": pertencemos, sim, à "galáxia da Internet". É uma revolução que muitos ainda não compreenderam.
Da educação às novíssimas formas do lazer, passando pela competitividade económica ou defesa nacional, tudo se joga, hoje, na magia do computador e do "mapa-mundi digital", se me permitem a expressão.
Descartes afirmou: "Penso, logo existo". No século XXI, a divisa será, salvo erro, esta: "Estou ligado, logo existo". Thomas Friedman fala de um "mundo plano".
O Presidente francês Nicolas Sarkozy, ao romper com a velha estratégia de defesa do general De Gaulle, sintonizou-se com os novos tempos. A França vai reduzir as suas forças "convencionais" e investir, massivamente, na "vigilância informática e por satélite" (http://dn.sapo.pt/2008/06/18/internacional/sarkozy_define_terrorismo_como_inimi.html). A grande fatia do orçamento militar da França – 200 mil milhões de euros, do total de 377 mil milhões – vai ser gasta nesses tais "sistemas de vigilância". A "informação militar" tem já um peso estratégico brutal.
É todo um "Admirável Mundo Novo" que se espraia, afinal, à nossa frente. Os ataques "ciberterroristas", com o epicentro na Internet, são, pois, uma das grandes ameaças que pairam sobre as nações. (Desde) há algum tempo atrás, mediante uma análise cuidadosa das novas tendências e de fontes intelectuais insuspeitas, venho falando da "Netwar" e da "guerra assimétrica", mas os nossos burocratas e pacóvios provincianos, tentando disfarçar a tremenda ignorância, fingem que isso é apenas "teoria da conspiração" e "futurismos" de quem, já se vê!, não tem mais nada para fazer. Eu falo, com o apoio dos factos e estudiosos da matéria, da mais pura realidade. Eles vociferam, pelo contrário, um estado impenitente de fragilidade mental, tentando "ler" o mundo através dos sentimentos pessoais ("eu acho que...") e dos palpites ditados pela gritaria circundante.
Uma outra área onde a relevância das "novas tecnologias" tornou-se crucial é, precisamente, a defesa da cidadania e dos direitos fundamentais. Veja-se a notável Petição que está a correr na Internet, aberta à assinatura e aos comentários de qualquer "cibernauta" interessado (http://www.ipetitions.com/petition/dicriminacaonaescola/index.html). Falo da Petição a favor da aluna Ana Rodrigues!
A peça é extraordinária, enquanto movimento de cidadania, e conta já com mais de 300 assinaturas, incluindo estudantes universitários, investigadores, profissionais liberais e pessoas das mais diversas origens sociais.
O "Netzen" nº 307, Serafim Duarte, diz o seguinte: "Uma tal decisão, além de injustificada e absurda, constitui uma clara violação dos direitos humanos e atenta contra a dignidade da mulher, ainda que jovem adolescente. O que as jovens nesta situação precisam é de todo o apoio da escola e não a sua discriminação e castigo. Porque é de um castigo que na verdade se trata. Isto é intolerável numa sociedade democrática".
A conhecida investigadora e minha amiga Roselma Évora afirma: " Inconcebível para um país que se diz exemplo de democracia em Africa e entretanto dá provas de violação de direitos humanos".
Maria Silveira é lapidar ao referir-se ao dislate "administrativo" do Ministério da Educação: "Para além de injusto não é solução para o problema de gravidez precoce".
Amélia Sacramento Monteiro: "Esta lei deve ter sido copiada dos TALIBÃS".
Eli, por sua vez, manda um recado suave à "classe dirigente" em Cabo Verde: "Makes no sense..."!
Com esta simples e significativa Petição, a favor de uma jovem aluna injustiçada, os cidadãos cabo-verdianos, espalhados pelas sete partidas do mundo, deram uma grande lição de cidadania às Veras Duartes e demais "organismos" de fachada que fingem actuar, chupando as verbas oficiais, em prol da liberdade e dignidade humana.
É certo que S. Majestade o Senhorio José Maria Neves tentou desqualificar esse belo gesto de cidadania, impregnado, aliás, da mais nobre e comovente vontade de ajudar o próximo. Para esse pequeno tirano neo-stalinista, a citada Petição não passou de uma "tempestade num copo de água". Ou seja: a Constituição da República e os valores fundamentais que ela defende não merecem qualquer atenção especial do Governo. São supérfluos, rótulos sem importância, perante a suprema "razão de Estado" do PAICV e os "superiores interesses" da clique instalada.
Tornou-se evidente, mais uma vez, aquilo que muitos não gostam de admitir: não temos um Estadista no comando da República.Temos lá, pelo contrário, uma criatura de perfil autoritário, alguém que despreza a liberdade individual e repete os cacoetes irreflectidos do "quero, posso e mando". É a vigarice governamental no seu máximo esplendor!

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Jurista e Docente Universitário

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