O ILUMINISMO DE OLIVEIRA SALAZAR
O Iluminismo tem várias faces. É uma esfinge subtil. Abre um
espaço vasto de escolhas políticas, com imensas consequências práticas,
materiais, culturais e simbólicas. Não devemos esquecer que Salazar, em certa
medida, é o continuador do marquês de Pombal, símbolo lusitano do Iluminismo
autoritário. A ideologia é a mesma. A discussão sobre a transição cultural e
paradigmática, entre nós, é um debate largamente por fazer
No Sábado passado, 28 de Abril, à tardinha, assisti ao
último painel da mediática conferência sobre a "Geração Claridade".
Tratou-se, penso, de um exercício criativo e fecundo. O
investigador José Maria Semedo falou sobre Júlio Monteiro, Félix Monteiro e os
"rabelados" da ilha de Santiago. O escritor Joaquim Arena esteve impecável,
dissertando sobre a identidade dos cabo-verdianos nascidos na diáspora, cabendo
ao poeta José Luis Tavares encerrar o painel, com uma comunicação sintética e
brilhante.
No período do debate, pedi a palavra e, perante tão augusta
plateia, fiz alguns comentários acerca do fenómeno dos "rabelados". Falei de um
aspecto que, a meu ver, é decisivo, o qual, entretanto, nunca foi tratado pela
historiografia (ou sociologia) cabo-verdiana. Isto: a introdução de algumas
medidas de higiene pública, que tanto assustou a comunidade rural em causa, foi,
na verdade, uma tentativa de MODERNIZAÇÃO.
Tratou-se, pois, de levar as "luzes do progresso" àquela
comunidade do Santiago atávico e profundo, numa época dominada pelo Estado Novo
repressivo. Mas foi, de qualquer modo, uma tentativa de modernização
autoritária, na ausência das liberdades individuais e da democracia
política.
A rejeição das mudanças havidas no seio da Igreja católica
era, também, a rejeição de uma certa ideia de "modernidade".
Há várias teorias sobre a "modernização". Dei o exemplo,
neste mundo globalizado, da modernização da Singapura, por meio, também, da via
autoritária, sobretudo no plano político.
Já os Estados Unidos da América assumiram a independência
(em 1776) e a construção da nação, logo da modernidade, através da via mais
liberal, conjugando a liberdade económica com a política.
O Iluminismo tem várias faces. É uma esfinge subtil. Abre
um espaço vasto de escolhas políticas, com imensas consequências práticas,
materiais, culturais e simbólicas. Não devemos esquecer que Salazar, em certa
medida, é o continuador do marquês de Pombal, símbolo lusitano do Iluminismo
autoritário. A ideologia é a mesma.
A discussão sobre a transição cultural e paradigmática,
entre nós, é um debate largamente por fazer.
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