ROBERT MUGABE E PEDRO PIRES
Foi instalada, nestas ilhas, durante 15 anos, uma ditadura do
tipo Leninista, com polícia política, abolição dos direitos fundamentais,
partido único, economia estatizada e um ensino completamente dominado pelos
nababos do regime. A tortura, como muito bem relatou Onésimo Silveira, foi
estabelecida, pelos sicários instruídos em Cuba ou no Leste europeu, como método
de investigação e de perseguição dos opositores. Pedro Pires foi o mestre-sala
da ditadura. Hoje, pela voz de um poeta, aparece como o digníssimo representante
“da dignidade humana”. (…) Trago-vos um editorial lúcido, publicado no Diário de
Notícias, sobre a acção “política” do sr. Mugabe, que destruiu a economia do seu
país. Qualquer semelhança com os métodos da antiga ditadura de Pedro Pires é
pura coincidência!
Pedro Pires, pelos bons ofícios do Filinto Elísio, ora
residente em Fortaleza, vai receber (ou já recebeu, não sei) um doutoramento
“honoris causa” pelo seu papel na “construção” da liberdade e na defesa da
dignidade humana. Ao que parece, segundo li no Liberal, a proposta contou com o
firme apoio de uma cidadã cabo-verdiana e de um procurador do Estado de Ceará.
Muito bem.
Todos sabemos que o sr. Pedro Pires desempenhou um papel
importante na chamada “luta armada”, travada na Guiné Bissau. E que essa luta
contribuiu para o desmoronar do Império ultramarino português. Cerca de 33
cabo-verdianos, ou pouco mais, participaram na luta armada. Não se pode exagerar
a nossa participação, mitificando-a, nem tampouco diminui-la, reescrevendo a
História.
A luta anticolonialista esteve na génese do “25 de Abril”,
que, por sua vez, abriu as portas à nossa independência política.
O movimento dos “capitães de Abril” teve um significado
especial. É certo que os historiadores próximos do PAICV não gostam que se fale
disso, mas é verdade. Reparem que a Guiné Bissau proclamou a sua independência
em 1973.
Cabo Verde só em 1975, após um período negocial. Pedro
Pires teve que negociar com os “tugas”, como se dizia na altura.
Porque não houve qualquer “luta armada” neste País; e os
portugueses tinham sérias dúvidas acerca do PAIGC e da subsistência do nosso
povo. De qualquer modo, quando a força, no interior do MFA, pendeu para o lado
dos comunistas, derrotando as teses spinolistas, o PAIGC passou a ter todo o
apoio necessário, acabando, inclusive, por bloquear o pluralismo nascente, em
1974, e as outras forças políticas locais, como a UPIC do dr. Leitão da Graça.
As sementes da ditadura já estavam lançadas no terreno...
Por ironia da História, o sr. Pedro Pires e os seus
companheiros reabriram, num acto impiedoso, o chamado “campo de concentração” do
Tarrafal, prisão de triste memória, lançando, nesse calabouço salazarista, todos
os cabo-verdianos que tinham IDEIAS contrárias à cartilha do PAIGC. Parece que o
Filinto, nas alturas do arrebatamento poético, qual jardim platónico,
esqueceu-se da História recente de Cabo Verde!
No dia 5 de Julho de 1975, com pompa e circunstância, Cabo
Verde torna-se independente. Conquistámos, enfim, a nossa soberania nacional. Eu
era bebé, mas suponho que tenha sido um dia alegre. Um dia de festa. Ninguém tem
o direito de negar ao sr. Pedro Pires o seu papel na conquista da independência,
que é um marco em qualquer país do mundo, desde a invenção do Estado-nação pelo
tratado de Westefália, no século XVII.
Pois o que veio depois? Aí é que está...
Parece que o Filinto, no “dossier” entregue às autoridades
académicas de Fortaleza, omitiu por completo esse período!
Foi instalada, nestas ilhas, durante 15 anos, uma ditadura
do tipo Leninista, com polícia política, abolição dos direitos fundamentais,
partido único, economia estatizada e um ensino completamente dominado pelos
nababos do regime. A tortura, como muito bem relatou Onésimo Silveira, foi
estabelecida, pelos sicários instruídos em Cuba ou no Leste europeu, como método
de investigação e de perseguição dos opositores. Pedro Pires foi o mestre-sala
da ditadura. Hoje, pela voz de um poeta, aparece como o digníssimo representante
“da dignidade humana”.
O mais triste é que a douta proposta partiu de um homem [o
Filinto] que se diz apreciador da Tradição Americana de Liberdade, inaugurada
pela Constituição federal de 1787. Filinto, caramba!, esqueceu-se de um
princípio básico da filosofia política: a independência política não é, nunca
foi, sinónimo de Liberdade.
Se fossem a mesma coisa, haveríamos de concluir que a União
Soviética de Estaline ou o Camboja de Pol Pot eram “países livres”, porque, na
verdade, eram nações independentes. Mas não. Tal conclusão seria uma cretinice,
e uma incapacidade pura de distinguir e fazer juízos morais.
A Liberdade supõe um Estado de direito, uma democracia
representativa e o império da lei, e Filinto Elísio, amante da “rule of Law” e
do pensamento do autor da declaração da independência americana, como confessou
num recente artigo publicado no jornal Horizonte, tem a obrigação de o saber. A
Liberdade implica um “governo das leis” e não um “governo dos homens”, quer
dizer, a ditadura, seja ela “nacionalista”, “revolucionária” ou
“fascista”.
Nestes dias, Robert Mugabe tem conduzido uma dura campanha
contra os seus opositores. Quer “ficar mais tempo” no poder, alega o seu
partido, ainda que seja preciso “alterar” a Constituição. Os europeus têm feito
críticas duríssimas ao patético ditador do Zimbabwe, adepto do “socialismo
sincrético”.
Pedro Pires, ainda há dias, saiu todavia em defesa de
Mugabe, clamando pela sua presença na próxima cimeira euro-africana.
Companheiros do movimento dos “não-alinhados”...
Trago-vos um editorial lúcido, publicado no Diário de
Notícias, sobre a acção “política” do sr. Mugabe, que destruiu a economia do seu
país. Qualquer semelhança com os métodos da antiga ditadura de Pedro Pires é
pura coincidência!
Para Mugabe, não há nada, nem uma medalha pelos “feitos
patrióticos”, como a expulsão dos “brancos”?! É uma pena, porque ele também,
como Lula da Silva e o PT, defende os “sem terra”. Zimbabwe não tem poetas, eis
a questão!... Não sou um grande apreciador do pós-modernismo francês, mas há um
trecho de Jaques Derrida que gostaria de transcrever, aqui e agora, com a devida
vénia, tal é a sua pertinência e beleza filosófica: “La silhouette d’un fantôme,
la hantise de la conscience démocratique. Le fantôme a des droits et des
pouvoirs”.
Casimiro de Pina – casipina@hotmail.com
EDITORIAL DO DIÁRIO DE NOTÍCIAS (PORTUGAL)
O Presidente do Zimbabwe, Robert Mugabe, tem um jornal -
chamemos assim ao seu altifalante em papel - que costuma dar a táctica: "Porque
deve Tsvangirai ser tratado com paninhos quentes?", escreveu The Herald. No
Domingo, Morgan Tsvangirai, líder do partido da oposição MDC, foi violentamente
agredido pela polícia de Mugabe, tal como dezenas de seus apoiantes, tendo um
destes falecido.
A imprensa internacional publicou fotos de Tsvangirai, cara
tumefacta, cabeça marcada por vários pontos cirúrgicos. Mugabe, que recebia o
Presidente Kikwete da Tanzânia, explicou as críticas, assim: "Isso é coisa do
Ocidente." O Ocidente, a Europa, a Grã-Bretanha, enfim, "os brancos", culpados
de torpedear a independência daquele país africano...
Os abusos de Mugabe, no poder desde 1980, têm sido
frequentemente criticados fora do continente africano. Quando ele impulsionou a
ocupação de terras de agricultores brancos, muitos deles de nacionalidade
zimbabwiana e de famílias há várias gerações no país, a opinião pública
internacional escandalizou-se. Além da iniquidade da expulsão de cidadãos
desapossados dos seus legítimos bens, as ocupações de terras dos brancos
revelaram-se uma estupidez económica. Fontes de riqueza de um país que fora
próspero, as herdades deixaram de produzir e causaram o caos
nacional.
O Zimbabwe de Mugabe: 1729% de taxa de inflação. A
esperança de vida, que era de 56 anos, quando ele tomou o poder, é actualmente
de 37. As populações abandonaram o campo e cercaram Harare, a capital, com
bairros de lata. Recentemente, os polícias de Mugabe desalojaram esses muceques,
deixando 700 mil pessoas sem casa. O balanço político, social e económico da
longa presidência de Robert Mugabe, acrescentado à violência com que são
contrariadas as liberdades, levou a Grã-Bretanha, que governara o país no tempo
colonial, a bani-lo. O encontro União Europeia-África, que deverá realizar-se em
Lisboa, até ao fim do ano, durante a presidência portuguesa, está suspenso desse
diferendo. Londres não quer Mugabe e os países africanos têm feito finca-pé na
presença de Mugabe.
A violência contra o oposicionista Tsvangirai pode, porém,
mudar esse impasse.
Pela primeira vez, uma voz respeitada de África diz alto o
que o mundo também tem dito alto ao aprendiz de ditador de Harare: "Basta!",
disse o arcebispo sul-africano Desmond Tutu, Prémio Nobel da Paz em 1984. É
preciso que essa seja uma voz mais comum em África.
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