quinta-feira, 11 de outubro de 2007

CORRUPÇÃO EM CASCATA E HEGEMONIA CULTURAL

Ao contrário da retórica do poder, as “novas tecnologias” contam, afinal, muito pouco em Cabo Verde e não são a alavanca da inclusão e da prosperidade. A ilha Maurícia, ali na costa oriental africana, possui cobertura integral de Internet (“wi-fi”) desde 2005




Após a publicação do artigo “José Maria Neves mente com todos os dentes!” (www.liberal-caboverde.com/noticia.asp?idEdicao=64&id=15873&idSeccao=527&Action=noticia), um simpático amigo enviou-me uma longa lista de actos pouco transparentes – usemos, por enquanto, este suave eufemismo! – praticados pelo “Governo” tambarina.
Para além dos factos escandalosos por mim sublinhados, ele trouxe, com precisão matemática, outros mais, desde os concursos viciados, favorecimento de certos kamaradas, relatório engavetado na secretaria de Estado da Juventude, manipulação constante da rádio e televisão, traficância de terrenos, instrumentalização da Agência de Regulação, ilegalidades graves nas Forças Armadas, corrupção na Polícia, fraudes eleitorais, contratos milionários com as “associações” próximas do poder, etc., etc., etc..
É evidente que eu já sabia de tudo isso. Aliás, tenho denunciado, alto e bom som, toda essa porcaria governamental, seja nos meus artigos, seja nas conferências. A “longa lista” enviada pelo prestimoso confrade confirma, por outro lado, aquilo que afirmei no pretérito apontamento, ao salientar a natureza Gramsciana e maquiavélica do PAICV:
“A corrupção, para os partidos de matriz leninista, não é um ‘desvio’ de circunstância. É a condição normal de sobrevivência e prosperidade”. No dia em que deixar de ser corrupto ou trapaceiro, esse “partido” (na verdade, uma empresa de malfeitores gerida com astúcia) desaparecerá da cena política, como um meteorito na imensidão do vácuo!
Logo a seguir, veio à baila “o caso Silvino da Luz”, a fazer das suas em Angola, desrespeitando, gravemente, o Estatuto dos Diplomatas. O Presidente da República, o Primeiro-Ministro e o Ministro dos Negócios Estrangeiros mantiveram-se quietinhos nos seus postos, legitimando, assim, a bonita safadeza com o seu silêncio institucional.
A República foi conspurcada? Ora essa! “Tudo pelo Partido, nada contra o Partido” – eis o lema dos três mosqueteiros da Neveslândia!
O problema é que o pessoal, no labirinto confuso do “politicamente correcto”, não quer ouvir: O PAICV É UM PARTIDO TOTALITÁRIO QUE OPERA COM DOIS CÓDIGOS em simultâneo. A “ética” é um mero disfarce; um engodo sublime, para neutralizar a oposição e fragilizar a crítica.
Aliás, a ideia (em si) é tipicamente COMUNISTA. Foi o astuto Antonio Gramsci, o fundador do Partido Comunista Italiano, na primeira metade do século XX, quem criou esse ardil, que ainda hoje, com um toque irresistível, fascina as “massas” levadas pela emoção e irracionalidade. A ausência de memória histórica é, pois, a causa principal da bancarrota de costumes que estamos a viver em Cabo Verde.
Onde reina a desinformação, a impostura triunfa com a elegância de um príncipe. O “Moderno Príncipe” sonhado pelo corcunda italiano!
O “partido ético” é um código especialíssimo, um método de conquista do poder. É uma expressão técnica do VOCABULÁRIO COMUNISTA. Veja-se, urgentemente, o texto fundamental do filósofo Olavo de Carvalho, no seguinte endereço: (www.midiasemmascara.com.br/artigo.php?sid=3866).
A cultura totalitária é apenas isso: mitologia, trapaça, golpes baixos, pisando, por sistema, todos os pilares do Estado de direito e da civilização. Ver, a respeito, Ipojuca Pontes (www.midiasemmascara.com.br/artigo.php?sid=6029&language=pt ).
Sobre “O Pensamento de Gramsci”, ver a síntese do historiador Carlos Azambuja (www.midiasemmascara.com.br/artigo.php?sid=3596).
Vocês notaram alguma reacção (séria) por parte do “Governo” no caso “saco azul” do Ministério da Justiça ou no da perigosa intromissão do Sector Urbano da Praia do PAICV na esfera constitucional de um órgão de soberania, o Governo? Se souberem de alguma coisa, avisem-me por favor. Dou-vos um doce!
Da minha parte, só vi uma reacção significativa, e veio em forma de cinismo e dissimulação. Foi no dia 19 de Setembro, quando o Secretário-Geral do PAICV, Mário Matos, lançou uma “fatwa” contra a liberdade de imprensa, banindo do espaço público as tais “perguntas de tribunal”, categoria que só as mentes estalinistas conseguem decifrar na plenitude.
E que mais? A “Heritage Foundation” publicou o seu relatório sobre a liberdade económica. Volto a insistir nisso porque é importante. Os economistas, sobretudo, devem analisar e discutir os seus parâmetros. Cabo Verde aparece no 88.º lugar. Botswana está no 38.º lugar. Isto significa que, mesmo em África, é possível fazer muito mais, adoptando, claro, as políticas correctas.
O rendimento “per capita” de Botswana, um país democrático, é, por causa disso, superior ao do Brasil, um feito absolutamente notável (www.midiasemmascara.com.br/artigo.php?sid=6072&language=pt).
Um outro facto que passou ao lado (mas cuja importância é decisiva) é o relatório publicado pela nossa ANAC. Menos de 10% da população cabo-verdiana tem acesso à Internet. É um dado, vergonhoso, que deita por terra o discurso à volta da “sociedade de informação”, “cultura digital” e “governação electrónica”.
Ao contrário da retórica do poder, as “novas tecnologias” contam, afinal, muito pouco em Cabo Verde e não são a alavanca da inclusão e da prosperidade. A ilha Maurícia, ali na costa oriental africana, possui cobertura integral de Internet (“wi-fi”) desde 2005.
Não é por acaso que tem um excelente Indíce de Desenvolvimento Humano (IDH). O IDH de Cabo Verde tem conhecido, como se sabe, uma descida sustentável desde o ano 2001 (dados do PNUD, meus senhores). Mais palavras para quê? Não há sinais de melhoria, com a Electra que temos, com as telecomunicações que temos, com a burocracia que temos, com a máquina de corrupção que nos “governa”, enterrando, sabiamente, a Ética Pública no sarcófago da República. “Quo vadis”, Estado de direito? “Quo vadis”, dignidade humana? Tudo está perdido quando a esperteza caprina obscurece a razão e a legalidade.
O ambiente é kafkiano. Ainda há dias, vimos o senhor Fernandinho Teixeira (o tal das festanças!) a chantagear o Governo, “pedindo” 9 000 contos (sim, nove mil contos) para a “reparação” de uma estrada na sequência das chuvas, e coisas do tipo. O dinheiro virá e ninguém, certamente, irá pedir contas ao brilhante homenzinho! Um grupo de rapazes, vendo o caricatural episódio na televisão, replicou: “Com 30 contos, damos a ‘passagem’ naquele troço de estrada!”. Quando as instituições públicas entram em colapso, por arbitrariedade e incompetência das elites, o povo recorre ao arsenal cómico (o humor como “ultima ratio”…) para castigar os burocratas mais estúpidos e oportunistas.
Todo o mundo sabe, nos Mosteiros, como são “adjudicadas” as obras públicas. O critério é claro e transparente: militância partidária, de tal sorte que são os mesmos caciques que recebem as chorudas verbas do orçamento. Na quinta de Orwell os porcos querem ser “mais iguais” do que os outros animais, não é assim?
Mas Cabo Verde é um país lindo! A TCV trata de esconder os factos incómodos (já nem promove debates sobre as “grandes questões”). A RCV silencia as vozes que não interessam. O dr. José Neves pode estar a perder o rebolado em termos de “ética”, submerso no pântano da corrupção; mas não na TCV. Ali…ele é rei e senhor. A Sagrada Confraria presta-lhe a devida vassalagem.
Dou-vos mais um exemplo dessa Hegemonia Cultural: o Ministro José Brito apareceu, há dias, na TCV a justificar o descalabro da Electra. Pediu “sinceras desculpas”, falou manso, com a bonomia de um ancião, e a coisa ficou (plim! plim! plim!) por aí. Mas quem é o culpado pela situação da Electra? George Bush? Dalai Lama?
Lembrei-me, imediatamente, do politólogo Julien Freund. No tempo de Mao Tsé-Tung, a China viveu a maior fome da sua história. Era o tempo do “Grande Salto em Frente”. A experiência foi um desastre. Logo a seguir, algumas pombinhas da esquerda internacional, iluminadas pela figura de Jean-Paul Sartre, começaram a soletrar a desculpa: “Todos somos responsáveis pela fome que grassa na China”. É contra esse romantismo patético, e irresponsável, que Freund levantou a sua voz. A República da China, como ele esclareceu, tinha o seu Governo. Se algo correu mal, foi por culpa da elite no poder, que seguiu uma política económica desastrosa e estatizante. A responsabilidade era, pois, dessa elite, e de mais ninguém no mundo. Como ele escreveu: “A responsabilidade política é uma responsabilidade profissional, como qualquer outra responsabilidade”.
O senhor José Neves deve, portanto, assumir as suas responsabilidades. É o mínimo que se espera de um cavalheiro. Mas, como sua excelência não é sério, é inútil esperar qualquer gesto de seriedade vindo do Kremlin tambarina.
Fica, todavia, uma lição. O populismo nacionalisteiro tem um preço: a desorganização administrativa, a degradação dos serviços e o endividamento público. O “pedido de desculpas” é a outra face da irresponsabilidade, o código secreto da dissimulação. E só confirma a Primeira Lei da Termodinâmica, referente à “conservação de energia” da nomenklatura globalmente considerada. É a “realpolitik” com um toque de sedução.
O problema é que não existe um combate sistemático e consistente contra a rede de corrupção e as suas ideias circulantes. A imaginação dominante em Cabo Verde é quase toda ela esquerdista e tributária de valores contrários à liberdade.
Até os filmes e documentários são passados em função dos interesses da Hegemonia Cultural Gramsciana. Há coisa de dois anos, havia, na cidade da Praia, um movimento doentio à volta de um filme de Michael Moore, “Farenheit 9/11”. Só se falava desse filme.
A coisa fez um sucesso tremendo e houve até patetas alegres que saudaram Moore como o grande herói cinematográfico dos nossos dias. Fui o único, no meio da algazarra, a levantar a voz contra essa histeria colectiva. (Para uma análise demolidora do filmeco de Michael Moore, ver o brilhante texto “A arte do porcumentário” de Olavo de Carvalho, em: www.olavodecarvalho.org/textos/1a_leitura_2004_ago.htm).
O problema é que o pessoal não compreende que a Hegemonia Mediático-Cultural é a raiz da fraude e da corrupção. A base pela qual o “senso comum” é modificado.
Criticar apenas a “falta de ética” de José Maria Neves é fazer o jogo do “establishment”, atacando o problema pela rama, subscrevendo, em suma, a tese do “partido ético”.
É a confissão da desistência a médio/longo prazo…

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Jurista e Docente Universitário

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