segunda-feira, 30 de março de 2009

A “GRANDE RUPTURA” E A ILUSÃO DOS PEQUENOS VIGARISTAS

O “Magalhães” é apenas um “piercing”, uma notável “fuga em frente”, para preencher o irremediável vazio de um sistema corrupto e insustentável. A putativa Ministra da Justiça segue-lhe os passos: é um dos “focal point” do escândalo Saco Azul, mas finge que o povo não notou, ainda, a magna esperteza... A fachada tenta, assim, disfarçar as mazelas de um Governo podre e moralmente inconsistente
Mário Fonseca (http://www.expressodasilhas.sapo.cv/noticias/detail/id/7958/), numa digressão de fino recorte analítico, tentou captar, a partir de uma mudança extraordinária no vestir, um dos sinais mais significativos das sociedades contemporâneas: a afirmação do “self” e de um individualismo sem limites, muito próximo da anarquia.
Embora o autor e poeta (sim, poeta, e não vendedor de métricas vazias e desabafos cacofónicos e pseudo-artísticos, como tantas vezes se tem visto por aí...) não o diga expressamente, trata-se de um fenómeno de longo alcance, que já foi analisado por vários pensadores de gabarito. O tema é fascinante.
Para Francis Fukuyama, estamos perante a “grande ruptura”. Uma mudança tecnológica poderosa estaria, antes de tudo, na origem dessa revolução dos costumes e das mentalidades.
Lipovetsky fala, sugestivamente, na “era do vazio”. É a sensação do vazio interior (um “vazio de alma”, digamos...) que leva(ria) certos indivíduos a buscar, desesperadamente, uma espécie de “compensação” ou consolo na ostentação de “modas” absolutamente extravagantes.
As tatuagens, os “piercings” e tantas outras preciosidades do género são, hoje, um verdadeiro substituto da divindade. Uma espécie de “religiosidade laica” instala-se na sociedade.
O Homem é um ser que procura sentido, quer queira, quer não. Durante séculos, a Filosofia e a Teologia indicavam caminhos sólidos, tentando estabelecer uma convivência comunitária decente e uma ética de liberdade e dignidade.
No século XX, sob a influência de certas correntes artísticas (“new age”, surrealismo, movimento “hippie”, etc.), com eco nas maiores universidades, uma vasta operação intelectual de “desconstrução” dos valores foi montada e celebrada, com ufania, pelos bem-pensantes.
O Homem tornou-se “light” (H. Rojas) e a sociedade sem valores. A corrupção é apenas o epílogo de um fenómeno mais profundo. Perde-se o carácter e a própria sequência da história.
O homem “light” vagueia na ilusão, no mundo do prazer sem alegria; não leva nada a sério. Não é sério!
Conheço, por falar nisso, um politicante que, no dia 22 de Janeiro de 2006, cometeu vários crimes públicos. É uma figura curiosa. Hoje, usando a táctica da avestruz, o insigne cavalheiro pensa que pode apagar a história e tapar a impunidade e o lamaçal da arbitrariedade com a distribuição de uns quantos computadores. Ora, a mentalidade “assistencialista” não vai combater o desemprego nem resolver o problema nacional da falta de inovação.
O “Magalhães” é apenas um “piercing”, uma notável “fuga em frente”, para preencher o irremediável vazio de um sistema corrupto e insustentável.
A putativa Ministra da Justiça segue-lhe os passos: é um dos “focal point” do escândalo Saco Azul, mas finge que o povo não notou, ainda, a magna esperteza...
A fachada tenta, assim, disfarçar as mazelas de um Governo podre e moralmente inconsistente.
Mudando de latitude: estão a ver a famosa “crise financeira internacional”? E qual foi a sua causa principal? A compra desenfreada de casas e outros luxos semelhantes, sem que houvesse estofo para tal. É esta a base inegável da crise do “subprime”. Em cascata, deu-se, depois, o desmoronar de um sistema imponente e irresponsável. O “luxo democrático”, que procura o crédito sem ter poupança, gerou, deste modo, o caos. Mas ninguém quer falar disso. Culpar os “banqueiros” é mais fácil e rende votos. É certo que há banqueiros sem escrúpulos, mas eles não são a causa principal desta crise mundial.
Talvez seja o momento de as sociedades redescobrirem o autêntico sentido moral da Liberdade.
A tradição liberal nasceu, justamente, para afirmar a dignidade do Homem: “do Homem todo e de todos os homens”, como afirmou, em 1967, Paulo VI (“Populorum Progressio”, n.º 14).
A Liberdade é a contenção do “self” e não a afirmação anárquica do poder e da rapacidade.

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Jurista e Docente Universitário

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