A “GRANDE RUPTURA” E A ILUSÃO DOS PEQUENOS VIGARISTAS
O “Magalhães” é apenas um “piercing”, uma notável “fuga em
frente”, para preencher o irremediável vazio de um sistema corrupto e
insustentável. A putativa Ministra da Justiça segue-lhe os passos: é um dos
“focal point” do escândalo Saco Azul, mas finge que o povo não notou, ainda, a
magna esperteza... A fachada tenta, assim, disfarçar as mazelas de um Governo
podre e moralmente inconsistente
Mário Fonseca
(http://www.expressodasilhas.sapo.cv/noticias/detail/id/7958/), numa digressão
de fino recorte analítico, tentou captar, a partir de uma mudança extraordinária
no vestir, um dos sinais mais significativos das sociedades contemporâneas: a
afirmação do “self” e de um individualismo sem limites, muito próximo da
anarquia.
Embora o autor e poeta (sim, poeta, e não vendedor de
métricas vazias e desabafos cacofónicos e pseudo-artísticos, como tantas vezes
se tem visto por aí...) não o diga expressamente, trata-se de um fenómeno de
longo alcance, que já foi analisado por vários pensadores de gabarito. O tema é
fascinante.
Para Francis Fukuyama, estamos perante a “grande ruptura”.
Uma mudança tecnológica poderosa estaria, antes de tudo, na origem dessa
revolução dos costumes e das mentalidades.
Lipovetsky fala, sugestivamente, na “era do vazio”. É a
sensação do vazio interior (um “vazio de alma”, digamos...) que leva(ria) certos
indivíduos a buscar, desesperadamente, uma espécie de “compensação” ou consolo
na ostentação de “modas” absolutamente extravagantes.
As tatuagens, os “piercings” e tantas outras preciosidades
do género são, hoje, um verdadeiro substituto da divindade. Uma espécie de
“religiosidade laica” instala-se na sociedade.
O Homem é um ser que procura sentido, quer queira, quer
não. Durante séculos, a Filosofia e a Teologia indicavam caminhos sólidos,
tentando estabelecer uma convivência comunitária decente e uma ética de
liberdade e dignidade.
No século XX, sob a influência de certas correntes
artísticas (“new age”, surrealismo, movimento “hippie”, etc.), com eco nas
maiores universidades, uma vasta operação intelectual de “desconstrução” dos
valores foi montada e celebrada, com ufania, pelos bem-pensantes.
O Homem tornou-se “light” (H. Rojas) e a sociedade sem
valores. A corrupção é apenas o epílogo de um fenómeno mais profundo. Perde-se o
carácter e a própria sequência da história.
O homem “light” vagueia na ilusão, no mundo do prazer sem
alegria; não leva nada a sério. Não é sério!
Conheço, por falar nisso, um politicante que, no dia 22 de
Janeiro de 2006, cometeu vários crimes públicos. É uma figura curiosa. Hoje,
usando a táctica da avestruz, o insigne cavalheiro pensa que pode apagar a
história e tapar a impunidade e o lamaçal da arbitrariedade com a distribuição
de uns quantos computadores. Ora, a mentalidade “assistencialista” não vai
combater o desemprego nem resolver o problema nacional da falta de
inovação.
O “Magalhães” é apenas um “piercing”, uma notável “fuga em
frente”, para preencher o irremediável vazio de um sistema corrupto e
insustentável.
A putativa Ministra da Justiça segue-lhe os passos: é um
dos “focal point” do escândalo Saco Azul, mas finge que o povo não notou, ainda,
a magna esperteza...
A fachada tenta, assim, disfarçar as mazelas de um Governo
podre e moralmente inconsistente.
Mudando de latitude: estão a ver a famosa “crise financeira
internacional”? E qual foi a sua causa principal? A compra desenfreada de casas
e outros luxos semelhantes, sem que houvesse estofo para tal. É esta a base
inegável da crise do “subprime”. Em cascata, deu-se, depois, o desmoronar de um
sistema imponente e irresponsável. O “luxo democrático”, que procura o crédito
sem ter poupança, gerou, deste modo, o caos. Mas ninguém quer falar disso.
Culpar os “banqueiros” é mais fácil e rende votos. É certo que há banqueiros sem
escrúpulos, mas eles não são a causa principal desta crise mundial.
Talvez seja o momento de as sociedades redescobrirem o
autêntico sentido moral da Liberdade.
A tradição liberal nasceu, justamente, para afirmar a
dignidade do Homem: “do Homem todo e de todos os homens”, como afirmou, em 1967,
Paulo VI (“Populorum Progressio”, n.º 14).
A Liberdade é a contenção do “self” e não a afirmação
anárquica do poder e da rapacidade.
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