VIRGÍLIO: ENTRADA DE LEÃO, SAÍDA DE CORDEIRO
Tratando-se de crimes públicos, como é manifestamente o
caso, não se coloca o problema da “prescrição” do direito de queixa. É um
absurdo, porque, neste caso, o crime não é particular. O Dr. Virgílio Brandão,
por tudo isso, continua, à beira-mar tranquilo, sem levantar vôo.
Com uma formidável vantagem: sempre poderá construir, na
terra firme, os seus castelos de areia…
“La justice ne se possède point; elle ne se met point en
manuels, elle ne se projette point dans un code de règles statistiques; elle est
un effort, une visèe” – Michel Villey
Quem leu o último apontamento do Dr. Virgílio Brandão, essa
alma bizantina concebida nos trópicos, terá, decerto, chegado a esta singela
conclusão: “entrada de leão, saída de cordeiro”!
Há três ou quatro décadas, um jurista que cometesse erros
tão primários seria imediatamente lançado no “index” da incompetência, para
efeitos de higiene pública, no meio da chacota geral e da indignação dos colegas
de profissão. Há erros desculpáveis. Mas há também erros
grosseiros...
No tempo de um Baltasar Lopes da Silva, por exemplo, era
tacitamente proibido que um advogado, ainda por cima emproado, repetisse os
erros de um alfaiate ou usasse o verbo calafetado do pessoal da “taberna”,
usando um tópico virgiliano…
Os tempos mudaram! Aquilo que, ontem, era um defeito
irremediável, capaz de decidir a sorte de uma carreira jurídica, é hoje, na
estranha escala do doutor Virgílio, uma virtude inconcussa, capaz de catapultar
o mui benemérito autor ao Olimpo dos espíritos “superiores”!
Na “novilíngua” do ilustre Virgílio, o assumido professor
alfacinha, confusões gramaticais graves passam, assim, à abençoada categoria de
simples “gralhas”, como se fossem a expressão acabada de um saber cuja
“profundidade” é inversamente proporcional à respectiva falta de clareza. Que
privilégio! Virgílio Brandão, que eu saiba, é o primeiro cabo-verdiano, desde os
dias de Eugénio Tavares, o patrono da nossa Cultura, a reclamar o ceptro divino
para a mais deslavada ignorância intramundana! Histriónico, doutor…
De qualquer modo, agradeço o seu esforço, porque deu-me a
oportunidade, mais uma vez, de clarificar alguns pontos e explicar, melhor, a
razão de ser da Acção Popular, movimento cívico por excelência, no mais nobre
sentido da expressão.
No essencial, o mestre Virgílio continua igual a si
próprio: perdido, aos trancos e barrancos, no labirinto da sua retórica. As
questões essenciais são, em síntese, as seguintes:
a) No dia 22 de Janeiro de 2006, o senhor José Neves, por
livre e espontânea vontade, cometeu vários crimes, crimes graves em qualquer
Estado democrático civilizado, aliás comprovados por um Acórdão lavrado pelo
Supremo Tribunal de Justiça;
b) José Neves, com o seu comportamento inaudito, violou, de
forma temerária, o Estatuto dos Titulares de Cargos Públicos e cometeu,
inclusive, um crime de responsabilidade;
c) Os referidos ilícitos criminais têm, claramente,
natureza PÚBLICA;
d) Assim sendo, cabe ao Ministério Público (MP) deduzir a
competente acção penal;
e) Perante a omissão das autoridades, um grupo de cidadãos
achou por bem, nos termos da lei, avançar com uma Acção Popular, solicitando a
intervenção do MP através de uma petição dirigida à Assembleia
Nacional;
f) O objectivo, naturalmente, é evitar que a impunidade
faça escola neste país; evitar, enfim, que o sistema jurídico-constitucional
(isto é: o Estado de direito) seja pervertido pela prepotência de uns e pela
cumplicidade abjecta de outros tantos.
g) A atmosfera, de uma altiva podridão, torna-se mais turva
quando se sabe que este é um Governo que acolhe, no seu seio, um falsificador de
atestados médicos e promove, num consulado do além-mar, uma cortesã que pratica
a fraude eleitoral, o passatempo favorito nas “democracias de
fachada”;
Qualquer tentativa de jogar com “sentimentalismos”
jurídicos (do tipo: “esses fulanos querem negar a ‘presunção de inocência’ ao
José Neves”, etc.) é, pois, pura perda de tempo e uma tentativa desesperada
(feia, muita feia) de impedir a justa RESPONSABILIZAÇÃO DOS GOVERNANTES PELOS
SEUS ACTOS, em violação, refira-se, das mais elementares normas ético-jurídicas
(vigentes). Ninguém está, numa República democrática, acima da lei. Eis, salvo
erro, a implacável “rule of Law”.
Tratando-se de crimes públicos, como é manifestamente o
caso, não se coloca o problema da “prescrição” do direito de queixa. É um
absurdo, porque, neste caso, o crime não é particular. O Dr. Virgílio Brandão,
por tudo isso, continua, à beira-mar tranquilo, sem levantar vôo.
Com uma formidável vantagem: sempre poderá construir, na
terra firme, os seus castelos de areia…
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